Guerreiros de Aruanda
Informamos aos
amigos internautas, umbandistas ou não, que o presente tema é baseado em fatos,
atos e provas testemunhais, e não em lendas ou hipóteses, que não podem ser
provadas, e que devem ficar no campo da crença.
Torna-se
imperioso, antes de ocuparmo-nos da Anunciação da Umbanda no plano físico sob a
forma de religião, expor sinteticamente um histórico sobre os precedentes
religiosos e culturais que precipitaram o surgimento, na 1ª. década do século
XX, da única e genuína Religião Brasileira. No ano de 1500, quando os
portugueses avistaram o que para eles eram as Índias, em realidade Brasil, ao
desembarcarem depararam-se com uma terra de belezas deslumbrantes e já habitada
por nativos. A estes aborígines os lusitanos, por imaginarem estar nas Índias,
denominaram de índios.
Os primeiros
contatos entre os dois povos foram, na sua maioria, amistosos, pois os nativos
identificaram-se com alguns símbolos que os estrangeiros apresentavam. Porém, o
tempo e a convivência se encarregaram em mostrar aos habitantes de Pindorama
(nome indígena do Brasil) que os homens brancos estavam ali por motivos pouco
nobres. O relacionamento até então pacífico começa a se desmoronar como um
castelo de areia.
São
inescrupulosamente escravizados e forçados a trabalhar na novel lavoura.
Reagem, resistem, e muitos são ceifados de suas vidas em nome da liberdade.
Mais tarde, o escravizador faz desembarcar na Bahia os primeiros negros
escravos que, sob a égide do chicote, são despejados também na lavoura. Como os
índios, sofreram toda a espécie
de castigos físicos e morais, e até a subtração da própria vida.
Desta forma,
índios e negros, unidos pela dor, pelo sofrimento e pela ânsia de liberdade,
desencarnavam e encarnavam nas Terras de Santa Cruz. Ora laborando no Plano
Astral, ora como encarnados, estes espíritos lutavam incessantemente para
humanizar o coração do homem branco, e fazer com que alguns irmão de raça se
livrassem do rancor, do ódio e do sofrimento que lhes foram e eram infligidos. De
outra parte, a igreja católica, preocupada com a expansão de seu domínio
religioso, investe covardemente para eliminar as religiosidades negras e índia.
Muitas comitivas sacerdotais são enviadas, com o intuito “nobre” de “salvar” a
alma dos nativos e dos africanos.
Os anos
sucedem-se. Em 1889 é assinada a Lei Áurea. O quadro social dos ex-escravos
(índios e negros) é de total miséria. São abandonados à própria sorte, sem um
programa governamental de inserção social. Na parte religiosa seus cultos são
quase que direcionados ao mal, à vingança e à desgraça do homem branco, reflexo
do período escravocrata.
No campo astral,
os espíritos que tinham tido encarnação como índios, caboclos (mamelucos),
cafuzos e negros, não tinham campo de atuação nos agrupamentos religiosos
existentes. O catolicismo, religião de predominância, repudiava a comunicação
com os mortos, e o espiritismo (kardecismo) estava preocupado apenas em
reverenciar e aceitar como nobres as comunicações de espíritos com o rótulo de
“doutores”.
Os Senhores da
Luz (Araxás, Orixás), atentos ao cenário existente, por ordens diretas do
Cristo Planetário (Oxalá) estruturaram aquela que seria uma Corrente Astral
aberta a todos os espíritos de boa vontade, que quisessem praticar a caridade,
independentemente das origens terrenas de suas encarnações, e que pudessem dar
um freio ao radicalismo religioso existente no Brasil.
Começa a se
plasmar no Plano Terreno, sob a forma de religião, a Corrente Astral de
Umbanda, com sua hierarquia, bases, funções, atributos e finalidades. Enquanto
isto, no plano terreno surge, no ano de 1904, o livro Religiões do Rio,
elaborado por “João do Rio”, pseudônimo de Paulo Barreto, membro emérito da
Academia Brasileira de Letras.
No livro, o
autor faz um estudo sério e inequívoco das religiões e seitas existentes no Rio
de Janeiro, àquela época, capital federal e centro sócio-político-cultural do
Brasil. O escritor, no intuito de levar ao conhecimento da sociedade os vários
segmentos de religiosidade que se desenvolviam no então Distrito Federal,
percorreu igrejas, templos, terreiros de bruxaria, macumbas cariocas, sinagogas,
entrevistando pessoas e testemunhando fatos. Não obstante tal obra ter sido
pautada em profunda pesquisa, em nenhuma página desta respeitosa edição cita-se
o vocábulo Umbanda, pois tal terminologia era desconhecida.
Foi então que em
fins de 1908, uma família tradicional de Neves, Niterói-RJ, foi surpreendida
por uma ocorrência que tomou aspectos sobrenaturais: o jovem Zélio Fernandino
de Moraes, que fora acometido de estranha paralisia, que os médicos não
conseguiam debelar, certo dia ergueu-se do leito e declarou: “amanhã estarei
curado”. No dia seguinte, levantou-se normalmente e começou a andar, como se
nada lhe houvesse tolhido os movimentos. Contava 17 anos de idade e
preparava-se para ingressar na carreira militar na Marinha.
A medicina não soube
explicar o que acontecera. Os tios, sacerdotes católicos, colhidos de surpresa,
nada esclareceram. Um amigo da família sugeriu então uma visita à Federação
Espírita de Niterói, presidida na época por José de Souza. No dia 15 de
novembro, o jovem Zélio foi convidado a participar da sessão, tomando um lugar
à mesa. Tomado por uma força estranha e superior a sua vontade, e contrariando
as normas que impediam o afastamento de qualquer dos componentes da mesa, o
Zélio se levantou, dizendo: “aqui está faltando uma flor”, e saiu da sala indo
ao jardim, voltando logo após com uma flor, que depositou no centro da mesa.
Esta atitude
insólita causou quase que um tumulto. Restabelecidos os trabalhos,
manifestaram-se nos médiuns kardecistas espíritos que se diziam pretos escravos
e índios. Foram convidados a se retirarem, advertidos de seu estado de atraso
espiritual.
Novamente uma
força estranha dominou o jovem Zélio e ele falou, sem saber o que dizia. Ouvia
apenas a sua própria voz perguntar o motivo que levava os dirigentes dos
trabalhos a não aceitarem a comunicação daqueles espíritos e do por que em
serem considerados atrasados apenas por encarnações passadas que revelavam.
Seguiu-se um diálogo acalorado, e os responsáveis pela sessão procuravam
doutrinar e afastar o espírito desconhecido, que desenvolvia uma argumentação
segura.
Um médium
vidente perguntou: “Por quê o irmão fala nestes termos, pretendendo que a
direção aceita a manifestação de espíritos que,pelo grau de cultura que
tiveram, quando encarnados, são claramente atrasados ? Por quê fala deste modo,
se estou vendo que me dirijo neste momento a um jesuíta e a sua veste branca
reflete uma aura de luz ? E qual o seu nome irmão ?”
E o espírito
desconhecido falou: “Se julgam atrasados os espíritos de pretos e índios, devo
dizer que amanhã (16 de novembro) estarei na casa de meu aparelho para dar
início a um Culto em que estes irmãos poderão dar suas mensagens e, assim,
cumprir missão que o Plano Espiritual lhes confiou. Será uma religião que
falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os
irmãos, encarnados e desencarnados. E se querem saber meu nome, que seja este:
Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque para mim não haverá caminhos fechados”.
O vidente
retrucou: “Julga o irmão que alguém irá assistir a seu Culto ?” perguntou com
ironia.
E o espírito já
identificado disse: “Cada colina de Niterói atuará como porta-voz, anunciando o
Culto que amanhã iniciarei”.
No dia seguinte,
na casa da família Moraes, na rua Floriano Peixoto, n. 30, ao se aproximar a
hora marcada, 20:00 H, lá já estavam reunidos os membros da Federação Espírita
para comprovarem a veracidade do que fora declarado na véspera; estavam os
parentes mais próximos, amigos, vizinhos e, do lado de fora, uma multidão de
desconhecidos.
Às 20:00 H,
manifestou-se o Caboclo das Sete Encruzilhadas. Declarou que naquele momento se
iniciava um novo Culto, em que os espíritos de velhos africanos que haviam
servido como escravos e que, desencarnados, não encontravam campo de atuação
nos remanescentes das seitas negras, já deturpadas e dirigidas em sua
totalidade para os trabalhos de feitiçaria; e os índios nativos de nossa terra,
poderiam trabalhar em benefício de seus irmãos encarnados, qualquer que fosse a
cor, a raça, o credo e a condição social. A prática da caridade, no sentido do
amor fraterno, seria a característica principal deste Culto, que teria por base
o Evangelho de Jesus.
O Caboclo
estabeleceu as normas em que se processaria o culto. Sessões, assim seriam
chamadas os períodos de trabalho espiritual, diárias, das 20:00 às 22:00 H; os
participantes estariam uniformizados de branco e o atendimento seria gratuito.
Deu, também, o
nome do Movimento Religioso que se iniciava: UMBANDA – Manifestação do espírito
para a caridade.
A Casa de
trabalhos espirituais que ora se fundava, recebeu o nome de Nossa Senhora da
Piedade, porque assim como Maria acolheu o filho Jesus nos braços, também
seriam acolhidos como filhos todos os que necessitassem de ajuda ou conforto.
Ditadas as bases do Culto, após responder em latim e alemão às perguntas dos
kardecistas presentes
ali, o Caboclo das Sete Encruzilhadas passou para a parte prática dos
trabalhos, curando enfermos, fazendo andarem paralíticos. Antes do término da
sessão, manifestou-se um Preto-Velho, Pai Antônio, que vinha completar as
curas. No dia seguinte, verdadeira romaria formou-se na rua Floriano Peixoto.
Enfermos, cegos etc. vinham em busca de cura e ali a encontravam, em nome de
Jesus. Médiuns, cuja manifestação mediúnica fora considerada loucura, deixou os
sanatórios e derem provas de suas qualidades excepcionais.
A partir daí, o
Caboclo das Sete Encruzilhadas começou a trabalhar incessantemente para o
esclarecimento, difusão e sedimentação da religião de Umbanda. Além de Pai
Antônio, tinha como auxiliar a entidade espiritual Orixá Male, com grande
experiência no desmanche de trabalhos de baixa magia.
Em 1918, o
Caboclo das Sete Encruzilhadas recebeu ordens do Astral Superior para fundar
sete tendas para a propagação da Umbanda. As agremiações ganharam os seguintes
nomes: Tenda Espírita Nossa Senhora da Guia; Tenda Espírita Nossa Senhora da
Conceição; Tenda Espírita Santa Bárbara; Tenda Espírita São Pedro; Tenda
Espírita Oxalá; Tenda Espírita São Jorge; e Tenda Espírita São Jerônimo.
Embora não
seguindo a carreira militar para a qual se preparava, pois sua missão mediúnica
não o permitiu, Zélio Fernandino de Moraes nunca fez da religião sua profissão.
Trabalhava para o sustento de sua família e diversas vezes contribuíram
financeiramente para manter os templos que o Caboclo das Sete Encruzilhadas
fundou.
Ministros,
industriais, e militares que recorriam ao poder mediúnico de Zélio para a cura
de parentes enfermos e os vendo recuperados,procuravam retribuir o benefício
através de presentes, ou preenchendo cheques vultosos. “Não os aceite.
Devolva-os”, ordenava sempre o Caboclo.
A respeito do
uso do termo espírita e de nomes de santos católicos nas tendas fundadas, os
mesmos tiveram como causas, primeiro, o fato que naquela época não se poder
registrar o nome Umbanda, e o segundo, era uma maneira de estabelecer um ponto
de referência para fiéis da religião católica que procuravam os préstimos da
Umbanda.
O ritual
estabelecido pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas era bem simples, com cânticos
baixos e harmoniosos, vestimenta branca, proibição de sacrifícios de animais.
Dispensou os atabaques e outros instrumentos de percussão, além das palmas.
Capacetes, espadas, cocares, vestimentas de cor, rendas e lamês não seriam
aceitos. As guias utilizadas seriam apenas as que determinassem a Entidade que
se manifestasse. Os banhos com ervas, os Amacis, a concentração nos ambientes
vibratórios da natureza, a par do ensinamento doutrinário, na base do
Evangelho, constituiriam os principais elementos de preparação do médium.
Após 55 anos de
atividades à frente da Tenda Nossa Senhora da Piedade (o primeiro Templo de
Umbanda), Zélio entregou a direção dos trabalhos as suas filhas Zélia e Zilméa
de Moraes, continuando ao lado de sua esposa Isabel Morse, médium do Caboclo
Roxo, a trabalhar na Cabana de Pai Antônio, em Boca do Mato, distrito de
Cachoeiras de Macacu – RJ, dedicando a maior parte das horas de seu dia ao
atendimento de portadoras de enfermidades psíquicas e de todos os que o
procuravam. Em 1971, a Sra. Lilia Ribeiro, Presidenta da TULEF (Tenda de
Umbanda Luz, Esperança, Fraternidade – RJ), gravou uma mensagem do Caboclo das
Sete Encruzilhadas, e que bem espelha a humildade e alto grau de evolução desta
Entidade Missionária de muita luz. Ei-la:
“A Umbanda tem
progredido e vai progredir.
É preciso haver
sinceridade, honestidade, e eu previno sempre aos companheiros de muitos anos:
a vil moeda vai prejudicar a Umbanda; médiuns que irão se vender e que serão,
mais tarde, expulsos, como Jesus expulsou os vendilhões do templo.
O perigo do
médium homem é a consulente mulher; do médium mulher é o consulente homem.
É preciso estar
sempre de prevenção, porque os próprios obsessores que procuram atacar as
nossas Casas fazem com que toque alguma coisa no coração da mulher que fala ao
pai de terreiro, como no coração que fala à mãe de terreiro. É preciso haver
muita moral para que a Umbanda progrida, seja forte e coesa.
Umbanda é
humildade, amor e caridade – esta é a nossa bandeira. Neste momento, meus
irmãos, me rodeiam diversos espíritos que trabalham na Umbanda do Brasil:
Caboclos de Oxossi, de Ogum, de Xangô. Eu, porém, sou da falange (Linha) de
Oxossi, meu Pai, e não vim por acaso, trouxe uma ordem, uma missão.
Meus irmãos:
sejam humildes, tenham amor no coração, amor de irmão para irmão, porque vossas
mediunidades ficarão mais puras, servindo aos espíritos superiores que venham a
baixar entre vós; é preciso que os aparelhos estejam sempre limpos, os
instrumentos afinados com as virtudes que Jesus pregou aqui na Terra, para que
tenhamos boas comunicações e proteção para aqueles que vêm em busca de socorro
nas Casas de Umbanda.
Meus irmãos: meu
aparelho já está velho, com 80 anos a fazer, mas começou antes dos dezoito.
Posso dizer o ajudei a casar, para que não estivesse a dar “cabeçadas”, para
que fosse um médium aproveitável e que, pela sua mediunidade, eu pudesse implantar
a nossa Umbanda. A maior parte dos que trabalham na Umbanda, se não passaram
por esta Tenda, passaram pelas que safram desta Casa.
Tenho uma coisa
a vos pedir: se Jesus veio ao planeta Terra na humildade de uma manjedoura, não
foi por acaso. Assim o Pai determinou. Podia ter procurado a casa de um
potentado da época, mas foi escolher aquela que havia de ser sua mãe (Maria);
este Espírito que viria traçar à Humanidade os passos para obter paz, saúde e
felicidade.
Que o nascimento
de Jesus, a humildade que Ele baixou à Terra, sirvam de exemplos, iluminando os
vossos espíritos, tirando os escuros de maldade por pensamento ou práticas; que
Deus perdoe as maldades que possam ter sido pensadas, para que a paz possa
reinar em vossos corações e nos vossos lares.
Fechai os olhos
para a casa do vizinho; fechai a boca para não murmurar contra quem quer que
seja; não julgueis para não serdes julgados; acreditai em Deus e a paz entrará
em vosso lar. É dos Evangelhos.
Eu, meus irmãos,
como o menor espírito de baixou à Terra, mas amigo de todos, numa concentração
perfeita dos companheiros que me rodeiam neste momento, peço que eles sintam a
necessidade de cada um de vós e que, ao sairdes deste templo de caridade, encontreis
os caminhos abertos, vossos enfermos melhorados e curados, e a saúde para
sempre em vossa matéria. “Com um voto de paz, saúde e felicidade, com
humildade, amor e caridade, sou e sempre serei o humilde Caboclo das Sete
Encruzilhadas”.
DESCONHEÇO O
AUTOR